quinta-feira, 14 de maio de 2009

Pare e olhe a sua vida!

De um longo amor podem nascer filhos e seus filhos, uma casa, ensinamentos, alegria e dor – como em todas as vidas. Nós nascemos de tudo isso. Mesmo depois que os anos varreram a vida, o que foi bom pode permanecer – não como uma sombra ou um peso, mas como motivo de voltar a desabrochar. Passado o primeiro horror da morte com a sensação de tamanha impotência e vazio, começam a abrir-se frestas por onde a antiga claridade se derrama no agora.
Essa mesa nessa sala, esse filho e aquele amigo, esse som no piano, o ramo de árvore que a gente pretendia cortar, a calçada onde caminhava há muitos anos – tudo nos convoca: não para chorar o passado, mas para projetar no presente o que, tendo sido bom, nunca se perde.
E a gente vai tomando consciência de que deve aos amores que teve, aos amigos que esqueceu, à casa vendida junto com parte da infância, poder viver melhor outra vez, com outra pessoa ou sozinha, em outra casa, com outros amigos, com novos objetos no meio dos antigos.
Das coisas boas e belas que acabaram nos vêm sempre uma luz e uma capacidade de ver o mais banal com algum encantamento. Essa é a secreta mirada que todo mundo pode ter, mas que o acumulo de compromissos, o excesso de deveres, a exigência de sermos cada vez mais competentes e eficazes, talvez nos roube um pouco.
Esse secreto olhar cada um pode deixar vir à tona.
E a vida voltará a ser possível.


Lya Luft